quarta-feira, 21 de julho de 2010

A verdadeira história do Hospital de Base

Se a história do Cristianismo tem mil e umas versões, além das cinco do Novo Testamento, seria difícil que a história de uma faculdade de medicina fosse contada de um só modo. Versões anteriores a esta têm o pecado de terem sido feitas por pessoas que não estiveram presentes nas fases mais importante da instituição.Por outro lado , falta aos contadores de última hora , uma visão política do cenário, posto que são pessoas tecnicamente excelentes, mas desprovidas de qualquer cultura humanística.A antiga FARME,hoje FAMERP nasceu no bojo da política neoliberal, propósito maior da revolução de 1964, e perpetuada nos governos SARNEY,COLLOR,FHC E LULA..A razão de tal persistência se deve a um único fato- os políticos estudam muito pouco e o voto , a qualquer custo, paira acima dos interesses do bem comum.Vivem tucanos e petistas se acusaram reciprocamente de serem neoliberais.Em termos de saúde, ambos são extremados neoliberais.
Após a segunda-guerra, o Partido Social Democrata Alemão considerou que o mercado era mais eficiente que o Estado em levar as necessidades básicas ao cidadão. Ao Estado ficariam reservadas a educação, saúde, justiça e segurança nacional e internacional. Em 1944, o brilhante economista Milton Friedman apresentou , em Harvard , uma tese de doutorado na qual dissertava como se colocar a assistência médica na Economia de Mercado. Milton Friedman era um apaixonado pelo Mercado. Segundo ele,o Mercado era mais democrático que o Estado. Milton carregava a mágoa de ter sido preterido no concurso para Professor da Universidade de Wisconsin, conseqüência do anti-semitismo do Estado Americano. A primeira medida a ser tomada , segundo Milton. ,era formar um grande número de médicos(lei da oferta e da procura). A Associação Médica Americana com o seu poderio não deixou a tese , sequer, ser defendida.Enquanto isto, preparou o seu contra ataque à medicina de convênio, como hoje grassa no Brasil .Criaram o ECFMG,Educacional Counsil for foreign medical graduates,um programa visando levar para os States, o que havia de melhor no exterior.A seleção era extremamente rigorosa.Nos States,um longo programa de residência médica aproveitava a mão de obra barata para os convênios, ao mesmo tempo que adestrava o estrangeiro ao modo capitalista de se fazer medicina - pouco comprometimento com o paciente e muitos exames para prestigiar a indústria . Jarbas Passarinho,um dos arautos da revolução, talvez até nem mesmo sabendo, já que a doutrina vinha de fora, fez explodir o número de escolas de medicina., deste modo, acertava dois coelhos - dava a devida satisfação ao capital internacional e satisfazia o sonho da burguesia de ter um filho doutor.Que o número de médicos era muito pequeno no Brasil,não há a menor dúvida,Mas não se pode negar que as faculdades foram criadas com uma total irresponsabilidade, característica do regime autoritário.Eu não gosto de falar em regime militar..
Todos sabem que a manutenção de uma Escola de Medicina é extremamente onerosa. Era necessário uma Fundação que pudesse prover os recursos necessários. Em Rio Preto criou-se a FRESA, Fundação de Ensino Superior da Araraquarense.FRESA tinha como curadores:a Prefeitura de Rio Preto que nunca colocou no orçamento qualquer verba para a faculdade,Prefeituras regionais que não podem aplicar dinheiro fora do município,Associações de classes,cujos estatutos vedam a aplicação de dinheiro dos associados fora da categoria,instituições sem fins lucrativos ,que, por motivos da sua própria definição, não têm reservas decorrente de lucro.Além de não aportar qualquer recurso à Faculdade,a tal FRESA era a guardiã das escolas privadas,para evitar a fundação de faculdades congêneres;direito,filosofia,engenharia,etc.As associações de classe evitariam a escola de farmácia, de odontologia.Tão importante foi o papel da FRESA neste sentido que cidades minúsculas tiveram certas faculdades antes de Rio Preto.Em 1972,todo a Clínica Médica, saturada da corrupção da FRESA, se demitiu.Foi o caos.Nenhum médico rio-pretense quis pegar o abacaxi.Por um lado a especialidade já predominava na cidade.Por outro lado,.havia menos de 80 médicos em Rio Preto,.o que significava um medicina privada extremamente rentável.Ficar o dia todo na Faculdade, formando competidores futuros?Coisa para idiota. Durante oito meses ,eu Liberato Caboclo chefiei os Departamentos de Cirurgia e Clínica Médica, até a chegada do novo professor de Clínica.È bom que se diga que o Hospital de Base se resumia a um bloco de ambulatórios.Não havia Centro Cirúrgico.Durante 4 anos,eu treinei os alunos na Cirurgia Experimental.Às 5horas da tarde eu operava os pacientes cirúrgicos do Hospital de Base, nas casa de saúde privadas, depois do expediente normal.Durante seis anos
s minha vida foi essa: dar todas as aulas teóricas, fazer todas as visitas, fazer todas as sessões clínicas, fazer as provas e ficar de plantão todos os dias e todas as horas. Quando viajava (visitar meus pais) o Gilbertinho me cobria graciosamente. Formada a primeira turma,o MEC exigiu para que a escola fosse reconhecida que se elegesse um diretor com titulação acadêmica, livre-docente.Só havia três professores que preenchiam tal requisito:Eu, Liberato Caboclo,Werneck e Rubens Vieira.Werneck e Rubens declinaram em meu favor;EU fui eleito.Em pouco tempo descobri a farsa -a Faculdade era totalmente inviável,além do mais usava-se recursos humanos da faculdade em outras instituições privadas. As condições de ensino se deterioravam,o hospital era precário,os salários ,além de medíocres,eram pagos com atraso.Uma vergonha.Os alunos da segunda turma ,na colação de grau fizeram um discurso criticando a FRESA .Fui obrigado a enquadrar os alunos no 477.È claro que não me prestaria a este papel.Telefonei para o Reitor da UFSCAR e lhe pedi para manter a secretaria aberta(era um sábado).O Secretario Ernesto Vieira fez o registro.Os formandos não eram mais alunos.Ficaram uma “arara”.Pediram para o Dr.Ivan Rollemberg me dar uma ultima chance-pedir demissão para não ser enquadrado no 428.Contratei o advogado Aristides Lopes.Ele me sugeriu-vamos ganhar tempo,os salários estão atrasados,vc denuncia o contrato.Sob a proteção das leis trabalhistas,vc não pode ser demitido.Procurei o advogado Heleno Fragoso no Rio..A audiência trabalhista foi marcada em tempo recorde e eu fui expulso.E os meus colegas que haviam votado no Conselho Departamental pela denúncia ao MEC?.Puseram o rabo entre as pernas e continuaram submissos a FRESA e aos seus títeres. O único apoio que tive foi do presidente do Diretório Antônio .Maurício Goulart. “Euclidodacunhamente “falando, os professore são antes de tudo uns fracos!Consegui uma posição na Universidade da Flórida em Gainesville e para lá fui. A comunidade rio-pretense se movimentou e seis meses depois fui reintegrado,.como professor ,e,não ,como diretor.A derrocada da faculdade continuava.Numa estratégia bem sucedida conseguíramos fazer o Dr.Custódio Correia diretor da Fresa ,Traçamos um plano para dividir a oposição à faculdade.Os alunos queriam livre acesso ao Pronto Socorro.Havia resistência de alguns grupos privados,mas não dos donos dos laboratórios.Transformamos estes donos em paladinos da causa dos alunos.Exageramos a grandiosidade do feito Transformamo-nos em heróis.Na câmara foi uma apoteose .A consagração da nova liderança.Caíram com uns patinhos.Veio a reação.Na nova eleição da FRESA os representantes dos grupos privados foram reconduzidos à Presidência.Estava na hora da grande jogada.Fui para o Jornal e dei uma entrevista bombástica denunciando os interesses espúrios da FRESA.Fui sumariamente demitido .Logo a seguir o Diretor Dioclécio Campos Junior.Conforme combinado com os alunos, estes entraram em greve. Foi o caos .Sem mensalidades e sem movimento cirúrgico e pediátrico já que tivemos o apoio de todos os colegas do departamento de cirurgia e pediatria,a FRESA fez água..Depois de 4 meses houve a intervenção do MEC.O interventor teve pouco trabalho.Um promotor fizera um relatório pormenorizado da corrupção da FRESA,que foi extinta.Dois professores foram expulsos pelo interventor por ofensas pessoais.O Interventor designou o Advogado Faiçal Calil para,baseado na representação do promotor excluir os professores que prejudicavam a faculdade.O Dr.Faiçal usou o seguinte critério - quantos profissionais vc formou na sua área?nenhum -rua!.Quantos residentes vc têm atualmente?nenhum-rua!.Eu, Liberato Caboclo, já estava de malas prontas. Ficara seis meses sem poder trabalhar, com guarda no hospital, impedido a minha entrada. Conseguira um emprego em Minesotta. onde passei 2 anos. Este negócio de uns medíocres dizerem que eu os expulsei é um disfarce para quem fica com vergonha (se é que tem), de comer no meu prato.. Derrotados,eternamente perdedores,defensores intransigentes da corrupção da FRESA.Ao chegar dos States para comemorar o aniversário da minha filha, fui preso ,já que fora condenado a 2anos de prisão,à revelia.
A Sociedade de Medicina e Cirurgia,através do seu presidente,dono do laboratório que mais perdeu com a expansão do Hospital de Base, pediu a cassação do meu diploma ao CREMESP.Fui absolvido e louvado em prosa e verso.A extinção da FRESA só foi possível porque eu, eu Liberato Caboclo fizera o Hospital Austa.O mal do marxista brasileiro é ser muito idealista. .Os colegas do Departamento de Cirurgia foram os meus grandes aliados na derrubada da Fresa por tudo que eu havia feito por eles.Muito jovens já estavam maduros como cirurgiões e puderam tocar o Austa com rara proficiência. Eu formara uma plêiade de excelentes cirurgiões para o Hospital de Base e para o Austa.A extinção da Fresa resolvera o problema moral,mas não o estrutural.Dioclécio não viu perspectivas e deixou a faculdade indo para Brasília.A faculdade ia , de mal a pior.Em 1984, eu fui eleito diretor ,mas anularam (estavam pagando favor nepótico).Bem, a escola foi á falência e aí “quem anulou” foi me pedir para assumir a instituição.Na realidade os colegas que haviam assumido não tinham experiência com o jogo democrático e, apesar da honestidade canina e dedicação sacerdotal tentaram o impossível - administrar uma faculdade inviável. Dioclécio com toda a sua habilidade desistira .Mas agora o jogo político estava aberto.Na corrida para prefeito, o candidato do PMDB tinha apenas 18% e o candidato do PDS 56%.Na presença de Roberto Freire ,Vasconcelos e Manoel Antunes eu,Liberato Caboclo sairia candidato a prefeito pelo PCB para minar o Adail Vetorazzo. Foi o que fiz com a criatividade do China (Paulo Nakaoski). Foi um sucesso e uma novidade,já que,pela primeira vez, havia campanha na TV. O PMDB cumpriu o acordo e eu melhorei substancialmente a instituição.De 5 mil passamos para 50 mil consultas mensais.Criamos os serviços de psicologia, assistência social, fisioterapia,fonoaudiologia, terapia ocupacional,homeopatia,acupuntura ,fitoterapia. Instalei o CRAMI e a Faculdade de Enfermagem, autorizada na gestão Márcio Fioroni. Mais uma vez a faculdade se tornara inviável.A Constituição de 1988 proibira o município de manter ensino superior.Em outras palavras ,a faculdade não existia legalmente, já que fora instituída pela prefeitura de Rio Preto.Candidatei-me a deputado federal.Fui eleito com quase 50 mil votos gastando 20 mil reais meus e toda a energia do José Maria Godoy.Na campanha do segundo turno,.Maluf e Fleury prometeram estadualisar a escola.A assembléia acadêmica optou por Fleury,desde que Quércia se comprometesse a enviar o projeto ainda no seu mandato .se o Fleury não fosse eleito Num sábado ,na presença de Ulisses Guimarães.Jorge Fares ,Prof.,Walfrido Fogaça e de Liberato Caboclo.já eleito deputado federal,Quércia assinou o compromisso.Fiz mais de vinte comícios para o Fleury com os meus recursos.A partir daí,de ter feito uma faculdade de medicina ,de direito e de fato .eu fui alijado. Quanto a mim,estou muito bem. Continuo trabalhando com pesquisas, fiz a maior contribuição à fisiologia gástrica já realizada no Brasil - a secreção gástrica interprandial depende de mecanismos corticais, relacionados à memória. Sou editor de duas das maiores revistas de gastroenterologia do mundo. Sou professor emérito.já formei mais de 200 cirurgiões.
Agora, não se esqueçam
>quem fez a FAMERP e o AUSTA fui eu, Liberato Caboclo, contra tudo e contra todos.
Quem fez o decreto de estadualização foi Orestes Quercia.
O resto é.como disse Goethe- a inveja é a sombra do mérito!Desafio alguém contestar um só ponto do que aqui foi dito

2 comentários:

Unknown disse...

Olá Professor,

Sou estudante do quarto ano da FAMERP e me contagiei com a sua contribuição á história de nossa cara Faculdade de Medicina. Essa instituição que eu aprendi aos trancos a valorizar.

“Ficar o dia todo na Faculdade, formando competidores futuros?Coisa para idiota.”

Será que muito dessa mentalidade se alterou professor? Me parece que não.

Alguns não se dão ao trabalho nem mesmo de aparecer ao pronto socorro, aos ambulatórios, às enfermarias ou até às salas de aula.

Da próxima vez que for à faculdade levarei meu avental, meu estetoscópio e meu nariz de palhaço.

Sugiro que o Senhor complemente seu texto com a história a partir do momento crucial da Faculdade: A estadualização.

Forte Abraço

Flávio Henrique Barros De Simoni disse...

Olá Professor!
Sou aluno do 2º ano da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto e gostei muito do conteúdo do seu texto.Gostaria de saber se posso publicar seu texto no "Jornal Diagnóstico" do Centro Acadêmico(CAEZ), de forma a poder compartilhar com os acadêmicos esse conteúdo!Espero sua resposta em meu email: flaviohbs77@gmail.com
Caso queira acrescentar algo ou enviar outro texto, sinta-se à vontade!
Muito Obrigado!
Flávio Henrique Barros De Simoni
Coordenador de Comunicações
CAEZ